quinta-feira, 26 de maio de 2011

Apostando alto


Embalada pela grande repercussão que teve sua última novela, “Chamas da vida”, Cristianne Fridmann apresenta agora seu mais novo trabalho: “Vidas em jogo”. Um misto de suspense e tramas repletas de cenas de ação, esta novela tem muitos elementos para prender o grande público. Entretanto, a estreia foi vacilante e, até o momento, ainda não superou “Chamas da vida” em qualidade dramatúrgica.

Pontos positivos são muitos. O primeiro deles é, com certeza, Cristianne Fridmann. Firmando-se como uma excelente narradora de histórias, Cristianne encontrou na Record um espaço adequado para exibir suas teias de novelista. Apresenta estrutura flexível, para acompanhar a instabilidade da emissora, e interessantes perfis de personagens. Em especial, a taxista Andréia (Simone Spoladore), o malandro Ivan (Silvio Guindane) e o dublê Jorge (Sacha Bali) trazem frescor à trama e possibilitam representações dos mais diversos vértices: a ação, o drama, as situações do cotidiano, o aspecto lírico, etc.

Outro grande trunfo da produção é a presença sempre elegante, exata e talentosíssima de Beth Goulart. Apesar de sua Regina ser absolutamente convencional (uma empregada doméstica que, após muito trabalho, subiu na vida), Beth Goulart sabe como pinçar os mínimos detalhes de seus papéis para encontrar matizes profundos e complexos. Em um dos capítulos, Regina apareceu como uma impiedosa empresária que manda invadir um casarão e, cenas depois, como uma mãe carinhosa que propõe à filha que elas devem fazer juntas um "brigadeirão". Mesmo com esta oposição de atitudes, Beth consegue dar uma unidade intrínseca e coerente às atitudes da personagem.

Do elenco, também é de se notar as boas atuações de Guilherme Berenguer, Thaís Fersoza e Julianne Trevisol. Nos dois primeiros casos, não há grandes desafios. Afinal, não é a primeira vez que Berenguer interpreta o clássico galã ou que Thaís Fersoza faz a menina rica (aliás, Beth Goulart e Thaís Fersoza também aparecem como mãe e filha na reprise da novela “O clone”). Entretanto, Julianne Trevisol é absolutamente agradável, suave e intensa ao interpretar a dançarina Rita. Em um momento muito bom de sua carreira, Julianne conseguiu enterrar de vez o fantasma de Gór (da trilogia dos mutantes), papel em que ela abusou dos beicinhos e olhos semicerrados para demonstrar ira. Sem contar que a atriz dá show quando a personagem Rita dança em suas cenas.

Infelizmente, há muita coisa que está em descompasso na novela e a primeira delas que quero ressaltar é a abertura. Além de apresentar uma versão acelerada da música “É”, de Gonzaguinha (o que me faz lembrar imediatamente de “Vale Tudo”, situação mais propícia para tal canção), a ideia da abertura é esquisita. Os figurantes reagem artificialmente quando são separados pelas letras do logotipo, não há uma boa sincronia entre takes e música e, por fim, trabalhar a imagem da abertura nas cores azul e laranja não deu um bom resultado no vídeo.

Outro problema é o excesso de cenas de ação. Perseguições, carros batendo, gente pulando de ponte, tiros, socos, tudo isso apareceu à exaustão logo na primeira semana. E o que agrava ainda mais a presença de tais cenas é que, muitas vezes, elas não se originam de uma necessidade da trama, mas sim de uma estratégia duvidosa da emissora para garantir audiência. Desde “Prova de amor”, a Record insiste em repetir o estratagema, mas se esquece de que esta opção pode esvaziar a qualidade ou a densidade dramatúrgica das telenovelas.

Além disso, a péssima interpretação de Sandro Rocha como Cléber compromete muito a novela. Personagem que orbita na trama central, Cléber é, ao mesmo tempo, truculento, cruel e sensível. Todavia, Sandro está engessado e artificial em suas cenas. Também é de se notar a interpretação morna de Betty Lago. Quem já viu os trabalhos dela nas novelas “O amor está no ar”, “Pecado capital” e na minissérie “Anos rebeldes” sabe que ela pode alçar voos bem mais ousados e criativos do que o desempenho que apresenta nos últimos trabalhos.

Por fim, há uma inconsistência na trama que nasce da forma de se contar a história. Acredito sim que a novela é boa, mas não vemos uma definição exata da trama central. Qual é a história narrada? Qual mote detona a ação desta produção? Seria o triângulo amoroso formado por Guilherme Berenguer – Julianne Trevisol e Thaís Fersoza? É a problemática da ocupação ilegal do casarão abandonado? Ou será o grupo do bolão? Sabe-se que a intenção de Cristianne Fridmann é escrever uma novela calcada no suspense, incluindo muitos elementos que podemos encontrar em romances policiais (como no caso de um grupo onde seus integrantes são assassinados um a um por motivos escusos). Porém, o mistério deve ser reservado aos “porquês”, e não ao “quem” ou “como”. No momento em que Cristianne Fridmann der contornos à trama e puser ordem na casa, a novela poderá se tornar um grande sucesso da Record.


QUENTE
Além da própria autora, Cristianne Fridmann, a presença de atores como Beth Goulart, Julianne Trevisol, Guilherme Berenguer, Thaís Fersoza, Denise Del Vecchio, Lucinha Lins e Silvio Guindane dão vigor e força à novela. Também merece destaque o cachorro Zé, uma espécie de mascote que torna a produção simpática e oferece momentos de respiro em uma novela tensa.

MORNO
A trama de Vanessa Gerbelli e Leonardo Vieira não tem a mínima graça, além de apresentar desenvolvimentos previsíveis. Betty Lago também é outra que mostra apenas um trabalho regular, quando poderia aproveitar a mudança de emissora para dar novas possibilidades à sua carreira.

FRIO
Os problemas da Record na teledramaturgia se arrastam desde “Essas mulheres”: aberturas de gosto duvidoso, sonorização precária, entre outros. Porém, a maior reclamação dos telespectadores é que todas as produções da casa têm exatamente o mesmo código visual (cenários, iluminação, figurinos), ao ponto de não se perceber quando acaba uma trama e começa outra.

(por Jordão Amaral)

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